sábado, 29 de janeiro de 2011

Reino da solidão

Por entre o balaustre da sacada sou a luz do poste que ofusca sua visão.

De perto não me vês... sou forma em plena desilusão.

Das minhas mãos escorre o líquido que alivia da morte mais uma noite de verão.

Mais uma decepção, quando pensas que a insensibilidade alheia te arrasa por desertos

Livrando-te de ser apenas mais um na multidão

Essa mesma que habita a fumaça do cigarro em suas mãos molhadas

Cansadas...

A rainha da sua solidão.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Sou lago.




Primeiro jogou os livros, o caderno de três semestres atrás, a bolsa, os fones de ouvido, e por último se jogou. Seu vestido de listras azuis e brancas voaram junto ao impulso de seu corpo. De pé, do alto, ela podia ver o parque todo. Até o último skatista que deslizava naquela imensidão cinza da pista cortada pelo verde intrometido das poucas árvores enquadradas naquela tarde. Lembrara-se de ter pensado enquanto subia com aquele sol brilhando em seus contornos que esperava que ninguém tivesse ocupando o seu lugar; como se algum lugar no mundo fosse capaz de pertencê-la, como se ela mesma fosse capaz de pertencer a algum lugar. Estava vazio. Ela nunca soube definir o que sentia ao ver seu lugar desta maneira: um misto de felicidade por sentir-se unicamente corajosa por subir no mais alto ponto e de tristeza pelo exato mesmo motivo. Era janeiro e o parque estava muito mais cheio que de costume, o verão estava ardendo pela cidade, os parques eram os únicos refúgios dos paulistanos. Um pouco incomodada ainda, sentou-se. Dali podia observar o dia sendo. Os casais passeando, os cães se escondendo do sol, os apressados que usavam o parque como atalho, os aprendizes, os seguranças, os coqueiros, os bancos, os chafarizes, o lago abaixo de seus pés sempre tão calmo e raso, no fundo ainda era possível ver os skatistas, os cones, as escadas, os celulares, os rostos, a ligação esperada em cada sorriso escapista. E pensava desesperançada que as pessoas não se importavam em existir, olhando lá de cima não parecia doer em ninguém. Respirou fundo, observando as curvas de suas pernas sentada em forma de borboleta, ao reerguer sua cabeça pode observar que trouxera junto de si todo o cinza, o dia claro começara a se transformar no céu de chuva característico de São Paulo. O vento apressado fazia os chafarizes se contorcerem, as folhas balançavam quase que em renuncia. O lago antes calmo e raso, agora dançava em ritmo aleatoriamente definido por forças externas. Uma outra olhada pra cima, e depois que piscaram, seus olhos podiam ver todos indo embora. Era só o anúncio que uma grande catástrofe estaria por vir, e as pessoas não se demoravam a sumir. Feito filme enfiavam-se por entre as árvores, os bancos, seus pés fugidios nas escadas, os skatistas, os guardas, não sobrou ninguém, até os celulares foram guardados nas bolsas como a garantia da próxima ligação. O vento carregou meus livros e minha bolsa, ainda a tempo de segurar pude ver a ousadia do fotografo lutando pela última foto. Desistiu. Agora eu estava sozinha com o lago, que inutilmente dançava sua valsa mais bonita. Último ato. Só meus olhos como testemunha, eu nem me importava mais com o vento que levava meu vestido no mesmo ritmo do lago. Eu me deixava ir, sentia em mim toda a fúria e revolta da natureza. Como quem arma um show por amor à arte e não pelo lucro com a venda dos ingressos a natureza tinha sido abandonada à sua própria beleza. Não importava mais se alguém pagou pela vida, importava agora o que nunca poderia ser visto. Então é isso, a vida te custa caro e você foge no momento que ela se mostra como é? Eu pensei desesperançosa que minha vida era como o lago, era como essa força da natureza. Apreciada quando calma e lenta. Quase superficial. E quando se mostrava, quando não suportava mais não ser só como se deve ser, assustava. De antemão as pessoas fugiam sem saber se ainda o que viria poderia ser belo. Fugiam por não saber apreciar o que existe fora do lugar-comum. Por não saber lidar com o inesperado. Por não saber estender os braços, e totalmente alheios aos julgamentos fechar a última cena dançando comigo. Que insistente continuava ali...
Não que os dias de sol não tenham sua beleza, longe de mim afirmar isso, mas me diz, quem mais sabe apreciar, livre como o lago, um dia de chuva?

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O preço.

E se eu abrir essa porta, o que acontece?

E abriu. Teimosa, sempre quis saber o que havia por trás do silêncio.
É claro que ele não deveria ser rompido. Você sabe quão doloroso pode ser a quebra de algo que se construiu sobre bases sólidas?
O preço? A sua vida.
Não, você não vai morrer. Não no sentido literal da palavra. Por quebrar o segredo do mundo você deve continuar viva. Deve sentir o que tem por trás do além. Você deve ver o que não pode ser visto. Sentirás dor, mas não poderá ser curada. Desesperos de quem tá cansada de tentar. Perderá toda a fé em qualquer coisa, e não terá nada a que se agarrar nos dias em que se sentir só. Tudo por ter aberto a porta.
Tudo por ter visto. Feito esfomeada mendigará um pouco de atenção. Será tratada por médicos que ficarão conhecidos por tratar loucos. Tomará em vão remédios que serão vistos como remédios de loucos. Andará alheia pelas ruas, verá beleza no movimento das águas, das folhas, na chuva. Você assustará as pessoas. Me diz, menina. Que beleza carrega a loucura? Quem acreditará em você?

Me diz até quando você pode continuar?
Quem pode acreditar em alguém que não tem braços pra carregar a própria vida?

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Duelo

Existem dois cavaleiros.

Um deles usa um escudo branco, limpo, leal, quase divino. Uma armadura prateada tão impecável quanto a clareza de seus olhos, sua espada brilha em tamanha intensidade que é capaz de ofuscar a vista do inimigo.

O outro tem um escudo ouro envelhecido, tão belo, peça rara, de encher os olhos. Sua armadura tem algumas marcas de combate, é fosca, não sei deduzir a cor, ele está sempre do lado mais escuro da batalha. Sua espada por fim não possui nenhuma beleza, mas possui a frieza dos que sabem onde devem levá-la para chegar ao fim de uma guerra.
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Enquanto eles dois duelam vacilantes, no espaço sobram espadas, escudos, no ar viajam os erros, os desencontros, os golpes todos são recebidos e silenciados pelo palco de um desastre iminente: o meu peito.

Não existe mais lado bom ou ruim, não existe mais o predileto, agora existe somente a vontade de que um deles vença para que silencie essa luta dentro de mim.

Existe somente a vontade de chegar ao fim
seja ele pra mim bom ou inevitavelmente ruim.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Isso acaba?

É chegar ao máximo da humanidade. Admitir à outra pessoa que precisa dela. Implorar uma mão pra segurar a tua cansada. É pedir para alguém um carinho, um colo, um gesto. Uma palavra qualquer.
E se essa mão não vem, e se mesmo assim as palavras continuam sem viajar no ar, e se mesmo assim o carinho, o colo, os gestos, todos os olhares são negados. E mesmo assim, o máximo só pode ser atingido se entenderes a continuidade do tempo. Ninguém pode ser ruim por não te amar. Mas isso não lhe confere direito de ser insensível. O tempo ensina que nada é imortal a não ser ele mesmo. Negar acolher é ainda permitir que o outro morra. É permitir que o amor morra, que as lembranças boas de todas as manhãs, tardes e noites vividas se desfaçam dentro do nada que é a memória de quem foi pra nunca mais voltar.
Mas também só o dono da dor sabe o seu tamanho. E de tão grande ela se torna incomunicável. Como dizer a você que te vi como uma maneira de salvar a minha vida? Como dizer que se eu me calar agora vou sufocar? Como dizer que estou sufocando? Que estou morrendo de morte matada por mim e não quero párar? Eu quero que os dias acabem para não ter mais que abrir os olhos para um novo dia onde todas essas esperas sequem a minha garganta. Onde todos os erros me abracem ao mesmo tempo e me apertem tão, mas tão forte que meu corpo não aguente mais de dor. E essa dor me faça desejar ter fé em algo que faça isso cessar. Como te dizer tudo isso se você não vem? Como fazer isso parar?

Deve ter algo, um sentido, uma resposta. Mas... onde está?

Onde você está?

Vai.

Quando esquecer se torna uma necessidade.***************
************A necessidade fica esquecida dentro do ontem.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Sem fim.

O desejo contido no peito.
Na garganta o grito
Nas mãos o vazio
Nos braços abraços não dados
A boca seca da falta
Os olhos molhados de cansaço
O coração no céu
Dentro dos olhos o último olhar
Dentro da lembrança a última frase

Eu vou te esperar.


Nada é último quando a espera finda.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Adentra.

______________As palavras sobrepostas
____com facilidade do vôo leve de borboleta
________________quando se achegavam coloridas
________________carregadas de esperança
__________________ao se afastarem enegreciam
_________levando a dor anunciada.
______Elas é que me salvavam.
Suas asas de traços finos
_______escreviam em meus olhos a paciência;
_______________só o amor é providencial na espera.

domingo, 9 de janeiro de 2011

Se liga, menininha.
























Deixa a vida correr, as coisas sempre partem pro inevitável.
Você nunca cansa? Você cansa as pessoas, sabia?
Essa mania de insistir que o caminho que você escolheu é o único que se há pra percorrer soa como birra de criança diante da ausência do doce preferido.
Você ficou parada por um tempo que não soube estimar diante do espelho, analisando seus olhos vermelhos, a lembrança mais clara da noite que passou. O seu cabelo caía por cima do seu rosto, quase que propositalmente para esconder o que sentira ao se ver.
Você resolveu que devia tentar. E achou que era digno continuar. Mas até você cansa, aquele cansaço de quem não tem perguntas a fazer, mas de quem precisa falar, de quem precisa explicar, de quem precisa dividir tudo isso que expande dentro de ti, encurtando sua respiração e esmagando todos os outros pensamentos que pudesse ter. Tomou conta de ti. Aquele cansaço de quem tenta gritar, mas não tem ouvidos para lhe ouvir.
Ali em frente ao espelho você tenta analisar o que tem te acontecido então. O que tem mudado seu jeito de agir, seu ímpeto ariano, sua personalidade escorpiana, logo você, duplamente regida por Marte agora parecia um desertor pedindo abrigo no peito do inimigo.
Logo você, que sabia lidar tão bem com a dor, com o silêncio alheio, com a necessidade de solidão de si mesmo. Que sabia continuar, mesmo quando não tinha mais em que acreditar. Deve ser isso, você não acha que seja possível mais continuar sem sentido. E você precisa desse sentido. Quando ele aparece, você vai sem pensar se é realmente de verdade, você se agarra como se aquela fosse sua última oportunidade de ser feliz. Você sufoca, você fere, você cansa. Você projeta, e se decepciona. Você decepciona também, e tenta mais uma vez.
Que medo é esse de não ser feliz, menininha? Até que ponto você precisa descer pra enxergar que no fundo só tem lodo e que é escorregadio, e se você chegar lá, você pode querer não voltar... você pode querer concentrar tudo isso que te resta de energia para se afogar nos sem fundos da tua alma. É mais fácil que encarar mais uma, é?
Amanhã, contra tua vontade o dia acorda novamente, o sol vai brilhar, as pessoas vão se casar, se separar, engravidar, amar, a vida vai continuar, e você vai ficar aí parada em frente a esse espelho tentando descobrir de quem é a culpa?
Não fala nada. Engole esse amor todo. Engole essa necessidade de outro corpo pra completar o teu. Engole esse desejo que te queima, engole essa dor latejante. Amanhã o dia acorda e quando o sol bater na janela do teu quarto vai enxergar o papel pendurado por um adesivo velho, e vai se lembrar do dia que essa perda mais te doeu, no papel você escreveu pra ti mesmo, porque precisava deixar o outro ser, você precisava deixar ele escolher continuar com ou sem você; o papel gritava teu nome, jogando todas as dores na cara: Se liga, menininha.

Se ligou?

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Ganapatya

Esperando que todas essas arestas dos lugares por onde passo, todas essas pontas, essas quinas onde bato meus pés nas noites escuras não me impeçam de continuar acreditando que um dia acordarei no lugar onde o mundo será feito de contornos macios e suaves, feito a curva que observo agora, bem onde termina o seu pescoço e começa o ombro, esse ombro que sequer é meu, mas é onde encaixo perfeitamente meu rosto cansado de tentativas frustradas. É claro que por trás dessa maciez de te imaginar meu ainda existem os ossos que sustentam o seu corpo abaixo de mim. E que a rigidez por baixo dessa pele pode ser tão dura quanto a vida, quanto acordar todos os dias rezando para que a mentira alheia não atrapalhe a minha verdade, desejando que as horas passem para voltar a ter segurança do corredor que se alonga até meu quarto, e que mesmo ferido de quinas e arestas meus pés encontrem o conforto necessário para sonhar o amanhã, não mais na curva do seu ombro, mas no encontro sincrônico do desenho emoldurado no seu peito: o seu coração.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Os olhos do coração.

Não era bem assim. As palavras soltas voavam junto ao vento dessa tarde de verão. Era verão, estava chovendo e frio. Meus cabelos estavam despenteados e os cotovelos ralados do balaustre mal feito da sacada. Meus olhos estavam cansados de mirar o ponto cinza e verde que se desenhava por trás do carro vinho estacionado do outro lado da rua. Ao lado da minha cama tinha uma porção de livros interminados. Eu lia um pouco de cada vez, pra que as histórias se misturassem, eu gostava da sensação de não estar lendo a mesma história que alguém já leu. Era como segurar o exato momento do sentido de um estranho. O suspiro da frase. As visitas estavam na sala. Era, obviamente, final de semana. Todos estavam deitados no tapete marrom e aconhegante, rindo, bebendo e falando coisas banais. Dessas que falamos quando nos sentimos a vontade na presença de alguém. Da sacada, meus olhos se desviaram do verde-cinza irremediável do dia. Em um movimento lento e preguiçoso eles buscavam o que jamais poderiam ver. Eles te queriam sentado na praça, onde aquelas folhas estavam todas despedaçadas no chão, eles te queriam de camiseta preta, desajeitado, sem saber onde colocar as mãos enquanto pensa no tempo que passa, enquanto inseguro imagina o que há de ser do nosso futuro. Enquanto aflito não sabe se deve ou não deitar ao meu lado. Eu te queria ali porque saberia que não poderia ter. Não era só a sacada que nos separava, não eram só meus olhos lentos e preguiçosos que não te encontravam, não era só a praça que estava molhada da chuva desfazendo a imagem serena de pintura de criança que eu tinha de você, era você também. Você não vinha, mesmo quando eu te chamava. Era um grito interno, pronto pra explodir dentro de mim. Mas eu tinha medo de assustar os passarinhos, porque quando você não vinha era neles que meus olhos dormiam, estáticos feito estátua de mármore desencantada. O grito morria preso entre a garganta e a boca e o ar que eu juntava nos pulmões me sufocavam cada vez que eu percebia que não poderiam me ouvir se eu não falasse. Era simples assim, óbvio assim. Mas eu queria ir além do óbvio. E você estava acima do simples. Talvez por isso escapasse das minhas mãos, feitas senão para o aparato rústico. A minha força bruta esmagaria sua perfeição de cristal.
E eu o queria vivo, inteiro, mesmo que longe. Como o queria. Em sua perfeição de pássaro caído sobre as folhas despedaçadas da praça que, na contramão do meu desejo, começava a anoitecer.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Digno.

Imaginar pássaros no plano azul do fundo da minha tela.

Certas vezes voo rasante. Outras tantas solidão.
Voam plenos longe do alcance da minha visão.

Construir o irreal surreal desfigura o real
quem disse o que suportamos pra viver?
in tuição.